[Quarta Parede] O Lado Negro do Meio Artístico

Na arte, existe uma parcela de humanos sonhadores que se iludem facilmente com a idealização de uma carreira artística glamorosa, além da possibilidade da fama. Mas falando nela, na fama, o verdadeiro artista, um dia, por bem ou por mal, irá entender que ela não é importante e nem fundamental em nossa carreira. O poder que o ator possui de educar, instruir, refletir, transformar e divertir com as interpretações dos mais diversos textos, é muito mais valioso e isso já traz o reconhecimento. O problema, talvez por culpa da própria desigualdade social existente no país, é que alguns acabam não conseguindo ter conhecimento e esperteza para não caírem em certas armadilhas… No meio artístico, assim como na vida, existem alguns aproveitadores que sugam a ilusão das pessoas com falsas promessas.

Clarislene Souza Falcão, 19 anos. Uma linda moça que nasceu no interior do Mato Grosso. Teve pouco acesso à educação. Concluiu o ensino básico em uma escola precária, onde diversos professores entravam e saiam nas turmas das quais fez parte. Faculdade? Nem pensar… Sua cidade é muito pequena e, além disso, o acesso à internet é limitado e o sinal para uso do celular é péssimo. A televisão é a única distração da jovem Clarislene, que desde pequena sonha em ser uma atriz da “novela das oito”.

Seguindo o seu sonho, Clarislene saiu da sua cidade para ir para São Paulo. Com pouco dinheiro (que conseguiu no emprego em uma lojinha) e sem o apoio dos pais, sem conhecer nada da cidade grande, impressionou-se, após muitas horas de viagem, com os prédios e o barulho dos automóveis e motos. Achou tudo muito bonito, as pessoas interessantes e diferentes da sua realidade. Não tinha para onde ir… Perguntou onde poderia achar um hotel, mas algumas pessoas de má fé a indicaram para lugares que na realidade serviam para as prostitutas levarem os seus clientes. Mas…

– Meu Deus! Que coisa linda! O que é isso?

Clarislene ficou diante do Theatro Municipal! Quis entrar lá de qualquer forma, mas não podia. Já era tarde e, sem autorização, não haveria esta possibilidade. Ficou sabendo que haveria visitação ao espaço dentro de dois dias. E mesmo sendo extremamente perigoso, a jovem decidiu acampar nas intermediações do local para não perder a oportunidade. Muitas pessoas a confundiram com uma mendiga, mas Clarislene, nem se importava! Entrar no Municipal era o mais importante. O dia chegou e a moça não se aguentava de tanta felicidade! Quando viu aquele palco, se viu nele, atuando e com a luz refletida sobre ela, com o público hipnotizado pela sua expressão e fala. E gritou para quem pudesse ouvir:

– Vou ser uma estrela de novela e teatro!

Pois bem, um rapaz ouviu e ficou bem atento ao que Clarislene disse. Aproximou-se dela e se apresentou. Disse que era produtor de elenco, Benito Arantes. Bonito, charmoso e bom de papo…

– Posso ajudá-la! Conheço muita gente da TV e do teatro! Inclusive posso descolar alguns trabalhos… Que tal um filme?

– Um filme… de verdade?

– Daqueles que passam na telona! Nunca foi ao cinema?

– Cinema? Não…

– Clarislene você é muito bonita, será uma grande estrela!

Na realidade, tudo foi uma ilusão… O tal filme era uma produção universitária, sem cachê, gravado às pressas, sem um bom roteiro e direção. Neste caso haveria poucas oportunidades de aprendizado… Além disso, foi hostilizada pelos colegas, pelo seu nome e seu jeito ingênuo… O primeiro personagem de Clarislene, na verdade foi cortado pela edição do filme. Sequer apareceu… Sozinha e sem dinheiro, ela não queria desistir! Mas engolida pela maldade de uma parte humana, que infelizmente existe, morreu ao ser atropelada por uma Mercedes. E ficou conhecida pela mídia sensacionalista… Mesmo assim, seja lá para onde Clarislene foi, tornou-se uma estrela, linda e de brilho próprio, longe da maldade de alguns homens. E brilhou nos palcos, nas telonas e na telinha da eternidade.

Texto de Luana Manso
Inspirado na obra “A Hora da Estrela”, de Clarice Lispector
Revisado por Zilma Barros
Foto: Zivalda Alves (Atriz)

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