Vou registrar um acontecimento real no texto desta semana. Uma oportunidade belíssima de trazer a arte teatral para pessoas que não tem fácil acesso a este produto artístico. No último dia 30, os atores Rodrigo Oliveira e Zilma Barros, juntamente com o diretor Diego Nunes, vivenciaram uma experiência linda e gratificante: apresentaram o espetáculo “1901“, peça produzida pela Habitart Produções Artísticas para uma plateia de deficientes auditivos, na EMEESP Profº Escola Mário Bicudo na Zona Norte de São Paulo. “1901” retrata o romance de Emilie e Ludovic, na virada de 1900 para 1901. É um espetáculo que não tem falas. Para melhor entendimento da história, foi utilizado o recurso de projeções. Para o público em geral, as intenções são pontuadas através de músicas clássicas, e certamente a interpretação dos atores precisa estar muito clara, mas não através de mímica e sim da pantomima, que é, no drama, a representação através de gestos, expressões faciais e movimentos.
O espetáculo “1901“, por se desprender do texto verbal, se torna um produto universal, de inclusão. Neste trabalho, as libras (forma de comunicação dos surdos), não foram necessárias, pois tanto o deficiente auditivo e o não auditivo conseguem compreender muito bem essa peça. O trabalho foi assistido por 60 pessoas aproximadamente. E eles ficaram encantados e muito agradecidos. Mas em peças com falas, as libras vêm sendo incluídas, através do trabalho de um intérprete em algumas produções. “Tribos”, em cartaz no Teatro Tuca, com Antonio Fagundes no elenco, é uma delas. Ainda assim, acredito que há necessidade de um crescimento nesta inclusão, afinal o mercado é cercado de inúmeros espetáculos.
“Apresentamos uma história para aqueles que não podem ouvir. Eles são membros de uma parcela da população que não recebe muita atenção e que são, por muitas vezes, esquecidos”. Declarou Diego Nunes.
Todos têm direito à arte, tanto para assistir quanto para estudar, executar e praticar. Aproveito a oportunidade para esclarecer uma questão em relação ao meu texto da semana passada, pois percebi que nem todos compreenderam seu objetivo, e entendo isso, afinal acredito na democracia e liberdade de pensamentos e opiniões. Minha última coluna falava sobre a hipocrisia de quem resolve ser um profissional da arte, se empolga ao extremo, porém percebe, no decorrer do tempo que este ofício é difícil, de trabalho árduo e, portanto, o abandona por algo mais “fácil”, que nem sempre trará prazer e/ou felicidade, prejudicando os trabalhos da direção, produção, elenco e dramaturgia. Acredito nos momentos de indecisão e em problemas que fazem desistir desta e de qualquer outra carreira. E creio que alguns as abandonam, porém, sem deixar de amar o que foi deixado para trás. De qualquer forma, temos que ter em mente e valorizar isso, que a arte é um trabalho muito sério, tão sério quanto a medicina, o trabalho do educador, do cabeleireiro, do vendedor, e de tantas outras profissões. Por isso, para ser profissional em qualquer área necessitamos saber se iremos suportar as dificuldades.
Precisamos, enquanto artistas, trabalhar para que todos tenham acesso ao teatro e às artes em geral. Este é o exemplo deixado pelo espetáculo “1901“, com sua iniciativa de apresentar para um público de deficientes auditivos. Ver a gratidão desta plateia, receber os abraços carinhosos e tão especiais, faz o trabalho artístico valer a pena!
Texto de Luana Manso
Revisado por Zilma Barros
Foto: Diego Nunes, Rodrigo Oliveira e Zilma Barros, juntos com os alunos que prestigiaram “1901”.