A coluna estava de férias, bem como esta que vos escreve e lá no meio do nada, olhando para o mar eu vi uma moça. Linda, loira, cabelos longos e corpo escultural. Passei a observá-la. Os cabelos, escovados, formavam cachos largos nas pontas que entregavam uma escova bem feita e demorada. No rosto, havia um pouco de maquiagem na pele e muito rímel nos cílios. Pulseiras adornavam os braços e brincos enfeitavam as orelhas pequenas e delicadas.

Estava um dia bem quente e eu mergulhava com constância. Entrava de cabeça no mar e a sensação das pequenas ondas que me lavavam, pareciam retirar de mim todas as mazelas acumuladas ao longo do ano. Soltar o corpo e deixar o mar tomar conta de mim, mesmo que por instantes, é indescritível, renovador. A moça linda entrava até a cintura, os braços para o alto segurando os cabelos longos e escovados, ela não podia molhar as pulseiras e muito
menos os cabelos. Ela não conhecia o mar de verdade.

Aquilo me fez pensar em como nós, atores, precisamos mergulhar de cabeça no personagem, sem medo de molhar nossos cabelos e nossa alma. Não dá pra molhar só até a cintura. O sentimento não será o mesmo, a veracidade, o olhar, nada será igual. É preciso que ocorra a entrega do nosso corpo e da nossa alma para essas ondas que nos tomam por inteiro.

É preciso deixar a vaidade de lado, é preciso esquecer o sutiã que abriu no meio da cena, o cabelo que voou na cara, a celulite à mostra, a voz não tão majestosa quanto a do seu colega, o volume de suas calças justas, é preciso molhar os cabelos.

Carla Buarque